sábado, janeiro 05, 2008

exorcismo

há sempre no ar um odor crido ser teu
será também minha vontade e desejo
o que porto em mim e sobre ti in cide
de muito te pensar e aconchegar no peito e na memória
trago-te nos olhos e na boca e nos ouvidos
e as folhas com seu húmus cheiram-me a ti
e um esquilo fulvo saltando célere na galharia distraíu-me súbito da contemplação
mas nele asinho vislumbrei a graciosidade ágil da fuga em nossos (a)braços
e desatei a ler 5 capítulos da obra resistente como se de uma penitência atordoante se tratasse
e após ao fim do quinto chegar
anunciou-se-me que lera tudo como se fora uma língua inexistente
porque estavas nos verbos e nas reticências parágrafos e oxímaros
estavas
e ora anseio cerrar olhos ao ímpeto da fadiga
és uma cunha persistente a suster pálpebras
e não consigo -- ainda -- dormir com os olhos abertos
e resigno-me ao desconcerto maior da tua ausência permanente em mim
tão distinta da tua fugaz presença
às vezes mal figurada no mundo escasso de espaço e parco de tempo habitado
foste para punires
e te ter todas as horas do dia
até à rendição extreme à fadiga bestial
aflição obsessiva e agonia
e hoje a mulher das cartas tinha teus olhos
e a empregada do bar o teu mavioso gesto de estender a chávena
e no posto da gasolina a caixa sorria a teus gentis modos
não há mulher assim tão plural e de ausente tão presente
só tu
pois to havia adivinhado no primo instante em que adreguei ver tuas mãos
e percebi serem as mãos destinadas para me dilacerarem as entranhas e entravar o corgo de sangue em afagos de seixos
de seguida soergui o olhar para te olhar
e o augúrio premuniu a luz vista e a palavra ouvida
como da esfinge muda no deserto frio da noite
e só agora que não estás -- há tanto tempo que deixaste de estar-- alcanço tua dimensão
e este espaço perdeu as medidas que o configuravam e estruturavam
e nele cabe apenas a premente e definitiva ausência
não voltarás
erijo-te em cruz
nela votivo me suplicio
na dor fundidos.