sábado, março 22, 2008

A metáfora da jante de liga leve...

O Carolina Michaëlis, que já teve o belo nome de liceu, não serve os miúdos do bairro do Aleixo, no Porto. Não, aquele vídeo não mostra gente com desculpas fáceis, vindas do piorio. Pela localização daquela escola, quem para lá vai vive às voltas da Boavista e os pais têm jantes de liga leve sem precisar de as gamar. Os pais da miúda histérica que agride a professora de francês estarão nessa média. Os pais do miúdo besta que filma a cena, também. Tudo isso nos remete para a questão tão badalada das avaliações. Claro que não me permito avaliar a citada professora. A essa senhora só posso agradecer a coragem. E pedir-lhe perdão por a mandar para os cornos desses pequenos cobardolas sem lhe dar as condições de preencher a sua nobre profissão. Já avaliar os referidos pais, posso: pelo visto, e apesar das jantes de liga leve, valem pouco. O vídeo mostrou-o. É que se ele foi filmado numa sala de aula, o que mostrou foi a sala de jantar daqueles miúdos.
Com a devida vénia, transcrito do DN - 21/03 - Ferreira Fernandes.
Sou professor há três décadas. Já leccionei no ciclo, no secundário e no superior. Trabalhei com milhares de alunos. Tenho gratíssimas recordações de muitos. Recordo o nome de todos os meus professores, e a maioria com um carinho mais ou menos especial. Admiro profundamente os meus pais. Nunca se me deparou uma situação idêntica à epigrafada. Sou um professor com sorte?
Não consigo, por mais que me esforce, ver-me na situação da docente de francês filmada pelo jovem eisenstein, que para culminar a humilhação e o gozo dado à "velha", pôs a correr a peça no youtube, acabando assim por prestar um serviço público notável.
Aqueles adolescentes, talvez rebentos de uma abastada burguesia portuense (cidade que eu mais que todas admiro), serão pais dentro de meia dúzia de anos, serão quadros médios ou superiores de empresas, da administração pública, educadores, o futuro, pois...
No efeito da bola de neve, temos vindo a assistir a uma crescente perda de todos os tipos de valores e a um crescente desprestígio da autoridade, quer familiar, quer escolar, quer judicial, quer...
Os pedo-qualquer-coisa-psiquiatras acham que o telemóvel é a extensão do corpo da teenager agressora. Também a chiclet o deve ser. Também o bonet na cabeça o deve ser. Também a histeria o deve ser. Também a violência o deve ser, a tal extensão...
Ou então, talvez já tenham nascido a mascar xuinga, a digitar sms's, de cocoruto abrigado, ao sopapo na placenta. Talvez.
E talvez nenhum "pai" lhes tenha dito que não se fala com aquela merda na boca, que o respeito manda tirar o chapéu, em casa, na escola, na igreja, perante os mais velhos, que o telemóvel-extensão-de-corpo-de-teenager tem funções especifícas, para momentos concretos...
Se calhar, estes adolescentes não têm pais. Se calhar, nasceram de geração espontânea. Se calhar, estes adolescentes, são os futuros cadastrados de amanhã. Se calhar, as sociedades não afectivas são geradoras de todas as violências. Se calhar, esta professora vítima destes energúmenos, terá, a partir de hoje, vergonha de sair à rua e de olhar os próprios filhos nos olhos. Se calhar, a "ultrajada" adolescente, é a heroína da escola, do quarteirão, da claque. Se calhar, os pais desta adolescente (se os tiver) comprar-lhe-ão um 3G de última geração. Se calhar, a Escola abrirá um daqueles inquéritos ou processo de averiguações com resultados análogos aos da Casa Pia. Se calhar, o Estado, o Governo, a Tutela, a Ministra da Educação, com a postura da ridicularização dos "professoreszecos", com o novo Estatuto do Aluno, municiaram estes vândalos, em roda livre, com a mais letal das armas... Para os outros, e a breve trecho, para eles próprios, para os próprios filhos e para a sociedade em geral.
Parabéns, pá!