afonia
Tento escrever-te e não alcanço as palavras com que quero dizer-te o que sinto.
O meu dizer é simples.
Porém, falha-me o tom, o síntono som, a exacta palavra que não transgrida a essência deste sentir.
E dia após dia adio a escrita, presciente de que sabes ler o meu silêncio.
Aliás, foi sempre em silêncio que melhor te falei e te escrevi.
Há uma saudade inefável e terna.
Há a memória da tua estuante seiva que me viça.
Há a tua imagem, constante, que permanece.
Há o som harmónico de um teu falar, que guardo…
E a ser assim, e que mais não fosse do que assim, é tanto o que tenho de ti, que por vezes sinto a vida faltar-me no ar que sorvo, ávido.
Também a verdade revela que quando estou a teu lado, o jeito sereno de estar não me aflui, e turva, tonto, o comportar.
Fica a boca seca e os braços de abraçar, pesados, como galhos velhos.
E só nos teus olhos me vejo e nos teus cabelos me acho.
E o gesto que esboço, no ar se queda, na inépcia de um jeito, que para ti me falta.
Prometo-te quando vieres ter as palavras todas para te saudar.
E um gesto novo, fluente e grácil, para te abraçar.
Tão suavemente como quem pega numa ceira de ovos novos, ou num copo esguio, elegante como tu, de cristal antigo de uma bavaria perdida.
Entretanto, escrevo-te assim, singelo.
E tu, na tua ufania voltigeante, num ápice me lerás, sorrirás nos olhos, e de novo, partirás…
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