domingo, fevereiro 17, 2008

fêmea de ti


A noite está tão calada... Assustam-me noites assim, como se fossem de cristal e pudessem partir-se a qualquer instante. Em noites assim posso ouvir-te respirar e cometer o suicídio da espera. Não sabes de quê, mas esperas. E eu não sei onde esperas sentado quem esperas. E espero que me esperes com um sol doirado nas mãos, um farol da cor do teu olhar, para que te veja e me junte a ti. E venho às cegas pelo portal que conheço, em busca do paraíso que prefiguro em ti. E o paraíso seria agora percorrer todos os recantos da noite pela tua mão. Ou ficar a contar estrelas contigo, embrulhados numa manta. E a falar, a falar... lias-me os teus poemas, eu lia-te os meus... bebia da tua boca o riso da madrugada, um chá antes do sol nascer e só então nos recolhíamos para fazer amor com os primeiros raios a lamber os corpos. O resto do dia seria doce lazer... A tua ausência era possível, se não existisses, como quando não existias, nem eras provável. Agora que existes, tudo que me apetece fazer é ficar a fingir que agora ainda é dantes e que nada me separa da minha razão de viver. E resulta. Deixo-me levar pelo esquecimento, fico muito quieitinha a suspender a voz, a decifrar as coisas banais e as horas deslizam como cobras de água, nem as sinto em volta do corpo. Às vezes não sinto nada. Mas depois algo tine na noite, um trinado talvez, um baque surdo no coração e eu estremeço, deixo de resistir e venho buscar-te entre os pregões que possivelmente te anunciam. Nunca sei se não me encosto a palavras que se encostam a ti, mas que importa se o resultado é a ternura e mais um ataque à tua noite, provavelmente ainda mais calma e distante que a minha... Por isso deixo aqui o meu corpo. Este é meu sangue. Este é o meu corpo que se retrai e distrai no teu. Esta é a minha alma que se nutre da tua e se acomoda em ti para se iluminar, se revestir do brilho magnífico dos astros. Perto do sol...

aNa