No vão das coxas dela, por Márcia Frazão.
Ela dizia que doí quando despontei à beira do poço escondido no vão das suas coxas. Doí uma dor que ela nunca sentira. Dor doída, sangrada, melada, enrolada em tripa. Doí tanto que de susto os mamilos fecharam as bicas e empedraram a Via Láctea. Susto doído, gritado, esperneado, faminto, desamparado. Susto mariano, enrolado em mantas franjadas e fraldas molhadas. Susto - que me perdoem os Josés - solitário, frio por paredes frias de maternidades mais frias ainda...Hoje, passados cinquenta e oito anos de vida aninhada em seus seios murchos, caídos, carcomidos pela terra que agora a cobre num poço escuro, sem coxas e sem vão, a dor - a dor danada - me estilhaça em Via Láctea sem leite, estrelas e vida. Doídamente descubro que aniversário só tem sentido quando as mães estão por perto...
Enviado para "os amigos especiais", por Márcia Frazão, escritora e jornalista brasileira.
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