domingo, novembro 22, 2009

Rond-point de Sernancelhe

Em Jacou, Rotunda de Sernancelhe, com escultura de Xico Lucena.
Curiosamente, esta é uma região de França onde não existe uma comunidade portuguesa instalada. São poucos, contam-se por duas mãos, estão perfeitamente integrados e são muito discretos.
O que não impediu que toda a semana fosse consagrada a uma "Hommage au Portugal".
Assim, e nesse âmbito, numa pequena cidade vizinha (Béliers?), na noite do dia 17, fomos convidados a ir ao cinema, depois de uma acolhedora recepção/jantar na Mairie de Jacou. O cansaço não convidava mas a simpatia dos nossos anfitriões era tanta, que não soubemos recusar. Passava a versão francesa de "Capitães de Abril", de Maria de Medeiros. O cinema cheio. O público era francês. Qual a minha admiração ao ouvir, a certa altura do filme, todos os espectadores, em coro, a cantar "Grândola, Vila Morena", com a letra integral, de cor... Foi um momento emotivo, porque feito com espontânea e vivida expressividade.
Dei comigo a pensar: isto em Portugal era inimaginável, por vergonha, atavismo, snobismo... Somos uns contidos/retraídos, e eles, aqueles gauleses, são do SUD, mediterrânicos puros, para quem o sentimento só importa se partilhado, ou melhor, muito e frequentemente partilhado...
O calor e a generosa afabilidade daquelas pessoas que tive o privilégio de conhecer, relembraram-me algumas coisas, por vezes esquecidas, como solidariedade, associativismo, genuíno interesse pelo outro. E isto, tem tanto mais valor, quanto o sentimos arredio do nosso quotidiano, na crescente endogeneização, 'repli sur-soi', vivência virtual, ausência de partilha, sendo esta o ponto alto da comunicação.
Não vim deslumbrado. Vim confortado. E hei-de voltar. E vou mandar cd's de fado ao Gérard, que tem 60 anos, andou a estudar português, que já fala muito bem, e sabe da nossa História, costumes e tradições , mais do que muitos de nós. Gosta de Amália, Cátia Guerreiro, Marisa, Camané. Conhece o mundo inteiro, mas é em Portugal que se sente em casa. Foi a Cabo Verde e conheceu uma família com um filho de 11 anos que sofria de uma doença que o deixaria, em pouco tempo, irremediavelmente surdo. Trouxe-o. Pagou-lhe a operação. Arranjou uma família de acolhimento para o receber durante meio ano. Depois de definitivamente curado, frequentou quatro meses uma Escola local. E foi-se embora, para a sua ilha, a falar francês, decerto melhor que o M. Soares! Podia ainda falar-vos da Françoise, que quer livros de autores portugueses, ou de meia centena de cidadãos que conheci, desde o director da Casa da Europa, ao mais anónimo de todos. Que querem ler Aquilino... que só tem três traduções, esgotadíssimas: "Le Roman de la Renarde" (que levei), La Voie Sinueuse", "Le Domaine"... e lêem Lídia Jorge, Mário Cláudio, Agustina, Lobo Antunes...