A Lengalenga das Pêtas
Minto por preguiça.
E porque deixei de substantivar a verdade.
Qualquer verdade.
Porque ela é fútil fruto de circunstâncias e de actores
E volúvel como um carrossel de feira franca.
Mas a mentira é como uma gata a estirar-se...
Uma volúpia.
E depois, quando me confrontam com diferentes versões da mesma história…
Que prazer, nagalhar as pontas soltas da pêta desastrada.
Minto por gozo.
A verdade é tão circunspecta…
Sisuda, muito geralmente.
Desgraciosa como uma velha nua engelhada.
Minto para combater a degenerescência cerebral.
E ocupar os neurónios em efabulações piramidais,
Erigidas a Osíris.
Minto por convicção.
Porque a verdade é sempre muito provinciana.
Néscia até.
Um affaire de pastores com tédio.
Ou costureiras sem dedal.
Minto por obrigação.
Que a minha verdade é tão ultrajante
Que seria açoitado no pelourinho
Se alguém ma adivinhasse.
Minto por esquecimento.
Julgo que falo comigo
Num anafado monólogo,
E como tenho pouco respeito por mim,
Tendo a esquecer-me das patranhas que me conto.
Minto porque sou um homem de bem
Como os políticos,
Cotado e apreciado, de opiniões acolhidas
E repetidas, até, nas soirées dançantes dos clubes dos viscondes.
Minto por respeito.
Por aqueles que seriam ofendidos
Se eu lhes contasse que não jogo bridge
Com as suas dóceis mulheres.
Minto por paixão.
Que é sempre aquela dor
Sentida por quem sofre de prisão de ventre.
Ou para armar aos eruditos,
Que falam nas vernissages,
De anexite bilateral específica.
Minto porque a verdade é uma merda.
E em latim, merda é merda.
E eu sou um filólogo competente.
Minto porque de tanto mentir
A mentira é uma verdade
Que as senhoras no salão de chá
Ostentam como um broche
Nos galhardos peitos
Sustentados por fatigados corpetes
De barba de baleia.
Minto porque cheguei a uma idade respeitável
E pré-venero os anciãos senis
Que apalpam as ufanas carnes da jovem criadagem.
Minto porque a verdade é uma cinza
Fria, fedorenta e poeirenta,
E Pompeia era uma tia velha e tonta.
Minto porque a verdade é uma cósmica conjugação
De factores tão exógenos aos factos
Que só a sua mais vera endogeneização é
Uma náusea aviltante.
Minto porque sou leal à Carta,
À Constituição,
Ao Dia da Raça,
E fiel às putas que amei.
Minto porque sim.
E minto ainda porque não.
Mas amanhã, quando passar por vocês
E vos disser bom dia, na rua,
Estai certas que o dia é bom.
-- O que quer que isso seja,
Onde quer que ele esteja.
Mesmo que a chuva a potes
Das bocas efusivas
Faça charcos de verão.
Viseu, 28 de Maio de 2009.
E porque deixei de substantivar a verdade.
Qualquer verdade.
Porque ela é fútil fruto de circunstâncias e de actores
E volúvel como um carrossel de feira franca.
Mas a mentira é como uma gata a estirar-se...
Uma volúpia.
E depois, quando me confrontam com diferentes versões da mesma história…
Que prazer, nagalhar as pontas soltas da pêta desastrada.
Minto por gozo.
A verdade é tão circunspecta…
Sisuda, muito geralmente.
Desgraciosa como uma velha nua engelhada.
Minto para combater a degenerescência cerebral.
E ocupar os neurónios em efabulações piramidais,
Erigidas a Osíris.
Minto por convicção.
Porque a verdade é sempre muito provinciana.
Néscia até.
Um affaire de pastores com tédio.
Ou costureiras sem dedal.
Minto por obrigação.
Que a minha verdade é tão ultrajante
Que seria açoitado no pelourinho
Se alguém ma adivinhasse.
Minto por esquecimento.
Julgo que falo comigo
Num anafado monólogo,
E como tenho pouco respeito por mim,
Tendo a esquecer-me das patranhas que me conto.
Minto porque sou um homem de bem
Como os políticos,
Cotado e apreciado, de opiniões acolhidas
E repetidas, até, nas soirées dançantes dos clubes dos viscondes.
Minto por respeito.
Por aqueles que seriam ofendidos
Se eu lhes contasse que não jogo bridge
Com as suas dóceis mulheres.
Minto por paixão.
Que é sempre aquela dor
Sentida por quem sofre de prisão de ventre.
Ou para armar aos eruditos,
Que falam nas vernissages,
De anexite bilateral específica.
Minto porque a verdade é uma merda.
E em latim, merda é merda.
E eu sou um filólogo competente.
Minto porque de tanto mentir
A mentira é uma verdade
Que as senhoras no salão de chá
Ostentam como um broche
Nos galhardos peitos
Sustentados por fatigados corpetes
De barba de baleia.
Minto porque cheguei a uma idade respeitável
E pré-venero os anciãos senis
Que apalpam as ufanas carnes da jovem criadagem.
Minto porque a verdade é uma cinza
Fria, fedorenta e poeirenta,
E Pompeia era uma tia velha e tonta.
Minto porque a verdade é uma cósmica conjugação
De factores tão exógenos aos factos
Que só a sua mais vera endogeneização é
Uma náusea aviltante.
Minto porque sou leal à Carta,
À Constituição,
Ao Dia da Raça,
E fiel às putas que amei.
Minto porque sim.
E minto ainda porque não.
Mas amanhã, quando passar por vocês
E vos disser bom dia, na rua,
Estai certas que o dia é bom.
-- O que quer que isso seja,
Onde quer que ele esteja.
Mesmo que a chuva a potes
Das bocas efusivas
Faça charcos de verão.
Viseu, 28 de Maio de 2009.
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