sábado, setembro 26, 2009

6ª feira à noite - uma intenção. Sábado, uma tentação.

Um mergulho na Vagueira. 27º e uma praia sem gente. O sibarítico luxo. Um almoço no Dory - Costa Nova - a saborear uns camarões da Nazaré e um bife quase tártaro 'ao alho'. As fotografias. Da minha terra. Somos de onde nascemos?
Quando a madeira vira cimento e alumínio e se engalana de cravos.
Batel triste.
A cor...
Com uma pulseira ao tronco.
Quase palafitas, de amarração.
Hão-de subir, as algas...
Ah, a Renata!? Afinal é um bote pobre?!

Assim, como proa, pôpa e quilha...
O cravo, também flor, prego, verruga, escala na noite acordes de frieza metálica. Ouço-os como um aconchego. Estou só. Pior, habituei-me à solidão e ao silêncio das vozes. Substituí a fala pelo pensamento. Em demasia. Leio. Tudo o que sai novo. De toda a parte. Releio as minhas canónicas obras. Comprei hoje as 700 páginas de "O tambor de lata", de Grass. Terei de esquecer a sua confissão para o ler. Como a Céline. E 100 páginas de Updike, o do sr. Coelho, mais magras que as capas gordas. Poemas -- "Ponto Último". Um homem de 75 anos a exorcisar o fim num encadear seco de quotidianas trivialidades. Mais música barroca. Há nela um conceptualismo estruturado em torno de uma forma rebuscada, como um casulo de seda, que cinge, no seu âmago o conceito que não quer libertar. Protegendo-o, como a máscara ao rosto.
Ardem-me os olhos. Uso-os em demasia. A ler, a escrever, a ver. Recordo a cegueira acidental de meu avô, um mor leitor, para quem, aos 7 anos, passei a ser os olhos de ler. Quantos livros lhe li de uma forma contrária a esta fluidez harmónica do cravo? Soletrando aqui, parando além, numa cacofonia que o fazia sorrir, de pálpebras cerradas, sem me ajudar num som que fosse, esperando que eu lavrasse o texto com meu arado. Sou um leitor precoce. De significantes. Anos depois, li-lhe os significados em todos os ângulos plausíveis do eixo paradigmático a obliquar da norma.
Há paz na solidão. Uma espécie de pureza despojada de adorno ou adereço, acrescida da reflexão em solilóquio, íntima. Escrevi há anos: "Um homem só tem-se mais a si." Mas que vale ter-me mais a mim? Ou, que me interessa ter-me mais e à minha insuportabilidade?
Acomodei num saco uns calções, uma toalha de banho, um pente, a máquina fotográfica e "A Ofensa", do Menéndez Salmón. Saio de manhã. Levo um carro sem capota (porque está sol e é agora que se usam) e vou ao mar. Quero vê-lo, cheirá-lo, mergulhá-lo. Tomar um mazagrin numa esplanada, à sua frente. E olhar para tudo em meu redor. Até para as pessoas, de modo quase indiscreto, mas só curioso.
O sono chega. Num afago lasso. A que me rendo, quase aliviado. Talvez sonhe com algo mais empolgante do que a visão do meu pé esquerdo, cruzado, nu, sobre a perna direita, a desenhar arabescos mirabolantes na parede branca. Talvez...