domingo, julho 12, 2009

Pia de abluções, jardim do casal Araújo, Granjal

-- Debruça-te!
Com a cova da mão cheia e despachada, como se manobrasse um balde, chapava-me água fria pelo rosto. Eu, mugindo, fugia com a cabeça, boca e olhos fechados. Mas ela, implacavelmente, repetia o lavacro tantas vezes quantas eram precisas para me varrer da pele a sombra duma sombra. Depois, à ponta de rodilha e com vigor esfregava-me os ouvidos, desensurrava-me o pescoço, usando de alguma brandura a limpar-me as capelas dos olhos. Finalmente, com o cabelo colado na testa, alvo como um lírio, empurrava-me:
-- Estás a pedir barrela. Vá, muito direitinho, e faça lá visitas à senhora professora.

Cinco Réis de Gente, Aquilino Ribeiro, Bertrand, 1ª ed. 1948.

Neste romance, 1ª tábua do políptico autobiográfico*, Aquilino, personificado aqui pelo Amadeu Magalhães, conta-nos os seus primeiros dez anos vividos no Carregal. Sua mãe, Mariana, aqui é Madalena, e as suas duas primeiras professoras são D. Teolinda e D. Letícia...

* 1948 - Cinco Réis de Gente

1948 - Uma Luz ao Longe

1918 - A Via Sinuosa

1945 - Lápides Partidas

(tudo congregado, de 1885 a 1908 em Um Escritor Confessa-se, acabado em 1963, editado postumamente em 1974, c/ data de 1972).