quarta-feira, janeiro 31, 2007
terça-feira, janeiro 30, 2007
segunda-feira, janeiro 29, 2007
domingo, janeiro 28, 2007
sábado, janeiro 27, 2007
dual
miro-te e é com alucinada lucidez que sinto o desejo todo de te ter de te tocar de dentro de ti tirar toda a mágica poção do existir toda a razão do ser perder-me em ti para em ti viver a umbrosa eternidade de todas as luas cheias
e comermos uma maçã juntos e nus sentados num mocho ao centro de uma sala vazia
goëmon autour du cou
"Mais le pire est toujours
D'ètre en dehors de soi
Quand la folie
N'est plus lucide
D'être le souvenir d'un roc et l'étendue
Vers le dehors et vers le vague."
"Les menhirs la nuit vont et viennent
Et se grignotent.
Les forêts le soir font du bruit en mangeant.
La mer met son goëmon autour du cou -- et serre.
Les bateaux froids poussent l'homme sur les rochers
Et serrent."
Eugène Guillevic, Terraqué suivi de Exécutoire, Gallimard, 1968.
sexta-feira, janeiro 26, 2007
la guèpe
"Hyménoptère au vol félin, souple, (...) la guèpe vibre à chaque instant (...) Elle semble vivre dans un état de crise continue qui la rend dangereuse. Une sorte de frénésie ou de forcènerie -- qui la rend aussi brillante, bourdonnante, musicale, fort vibrante et dès lors brûlante ou piquante (...)"
Francis Ponge, La rage de l'expression, Gallimard, 1976.quinta-feira, janeiro 25, 2007
quarta-feira, janeiro 24, 2007
segunda-feira, janeiro 22, 2007
geo grafias
"a tua escrita, para mim, é mais geográfica do que singular, mas nesta geografia reside a sua singularidade, porque não usas palavras avulsas, porque tens de repente uma tela à tua frente e começas a desenhar uma pauta de música. primeiro as cordas horizontais. depois os traços. e ao início escreves matematicamente. respeitas os limites das linhas impostas. mas esta regra é rapidamente transposta. porque a agulha do teu disco salta. ainda assim um movimento rigoroso. como um tigre sobre a presa. mas dá-se logo um descomportamento. quando os movimentos deixam de ser estudados e prevenidos. e passam a ser vorazes e determinados. o tigre come a sua presa! as tuas palavras desenham um mapa. uma cartografia incessante. o destino é apenas o início."
texto recebido por mail e publicado com o consentimento da sua Autora.
grito
baixam à recôndita partida
vozes à indecisão dos sons
soerguem-se os gestos no corpo
no ar voam esquissos de perfeição
e a agressão no rito poisa
contidas vozes dos poros refluem
as mãos aos ventres chamam
seios na boca fremem
e a boca à boca do seio grita
estremecemos a urgência
emergentes e brandas
lisas e sedosas
cicios as palavras
líquidas se libertam
crinas de pau
proscrito titubio em lamento e aquieto a saudade em melancolia
(volteio sempre a paixão no unicórnio azul com as crinas em pau doiradas)
como o cego que pede surdo ao toar do sino babo a litania de cadência e harmonia
revoada por pombos quase absortos no encanto de uma dor sem fim nem causa já lembrada
(mas que perdura e dá ternura ao ai crepuscular)
vesperal e exausto se recolhe o íntegro dia
as crinas de pau doiradas mais desfraldam e a cauda impa
ao sopro que sarilha na toada do carrossel
acomodados os balbucios ao bafo ardente
anseio que a noite chegue e lave a luz
domingo, janeiro 21, 2007
aras
há uma senda no pinhal que sobe até ao penedo branco
faunos imolam raízes nodosas nas aras do remorso
o mago ruivo semeia os pós de maio que cintilam no coruto das faias
como estrelas dardejantes de mel e perdição
os duendes aplaudem o ritual do fogo e luz
e a floresta desperta o musgo, os seixos, os tortulhos e a caruma
para o exorcismo e sagração que exulta e escorre das mãos abertas da Terra
nada que tive era meu
Nada que tive era meu.
Perdi estradas, perdi leito.
Na pedra onde me deito
nada fala de alvos linhos.
Se, com cegos, me aventuro,
a caminhar rente aos muros,
é que meus olhos impuros
sonham Cristo nos caminhos.
Nada que tive era meu
e o corpo não o quero eu.
Podia servir de embalo,
mas serve de sepultura.
Cemitério de asas finas,
tange e plange aladas crinas,
canto de praias sulinas
de infinitas amarguras.
Natércia Freire, in Poemas (1957)
O Livro da Natércia, ed. quasi, 2005.
sábado, janeiro 20, 2007
no nome a chama
Fiama Hasse Pais Brandão, 15 de Agosto de 1938 - 20 de Janeiro de 2007
Madressilvas e Tílias
A uma janela assoma
a clara madressilva;
a outra, as leves, verdes
folha da tília.
Disputam o meu olhar.
Numa hora lutam
com varas de penumbra.
Noutra, ferem-se em tudo
o que cintila. E no fulgor
nocturno entram nos quartos,
vencendo a negra luz
que avança para os meus olhos.
FHPB, As Fábulas , ed. quasi, 2002.