segunda-feira, abril 30, 2007










o coagido som


a linguagem da nudez...

domingo, abril 29, 2007

a vida campestre




é uma canseira, a vida de um provinciano labrusco.
bichas para ir regar os feijões, para as malhadas...
sol de crestar, galhardos toiros, velozes felídeos, por essas leiras a eito...
um entediante perigo!
tem que se levar a cruz.
por ora m'emudeço, bocejando.






A Restante Vida, MG. Llansol, R. d' Água, 2001


Lição XXIII -

"Confessámos uma à outra: -- Como me deixa triste a despossessão do tempo.
Já embarcadas na caravela, dissemos a medo: -- Vou ver. --
No porto, a caravela estava na noite que se opunha ao dia do ano;
gaivotas negras recamavam as velas,
e estrelas se enraizavam nas casas do porto

porque o rio é celeste
e a mútua morte pode encontrar-nos no caminho."

sábado, abril 28, 2007

alear


soturnidade






sexta-feira, abril 27, 2007

na noite, os montes


fim-de-semana


óleografias


manto de pedra


cais de breve marear

deste cais me embarco
rumo ao coruto das faias
onde desnudo me enredo
na água me iludo
eu da terra vindo
no ar me julgo
nos ramos me enleio
me perco a voar...

alpoldras

para pés de pecadores
(os que não voam)
alcançarem outras margens
as alpoldras maceradas
do canto das águas
escorreitas se alinham
se deitam
pontes singelas
para pisares
com magras mãos
tas estendi
por não voares
para não fugires
para voltares

pio e asa pena e bico

lutam pássaros da terra com aves do mar
pio e asa agride pena bico o ar

quarta-feira, abril 25, 2007

fraga & fogo --» para ti, a matriz

"mas eu sou, como o cardo, agreste: mordo a rocha e sobrevivo ao pó."
-fraga-
(...)
"Eu sinto o meu corpo exangue,
Cheio de tédio febril;
Vou dar-lhe banhos no sangue
Das madrugadas d'Abril; "
(...)
-Guerra Junqueiro-

e assim se coa o dia...


33º 25 de Abril

sombrias as ruas, triste o povo...

o autor deste blogue à época da Revolução

piscina do Grande Hotel da Figueira.
19/9/74

18/9/74


Na livraria Tempo Livre. Atrás, um poster da Seara Nova, 1974.





Permanente Alforria

1. o paredão enfrenta o mar que agride
2. a gaivota sulca o ar que acolhe
3. o sol arreda a nuvem que corteja
4. o mar liberta a onda que revolta
5. a areia sorve a água que agrega
6. o pé pisa a concha que estranha
7. o corpo saúda a natureza que alenta
8. a solidão rodopia no ar que afaga
9. a manhã coalha-se na luz que transporta
10. o cansaço esbarra no quadro que confronta
11. o sábado esgota-se no ocaso que redime
12. a intenção queda-se no esgar que não se cumpre
13. o domingo chega na cópia que oprime
14. o homem só regista o tempo que o suprime. e eis
15. que a liberdade toa no peito o acto de ufano feito ave,
16. no infinito convocando ao vento a esperança
17. em Abril canto comum de silêncios incontidos
18. liberdade do poder íntegro. inteira alforria do ser,
19. que nega a agressão
20. e ao pé o direito de pisar
21. e as solidões rodopiantes
22. e esgotados sábados redentores
23. e cansaços esbarrados de confrontos
24. e esgares em rictos mal cumpridos
25. e cópias das supressoras opressões.


pn, in Na Liberdade, Antologia Poética, 30 anos - 25 de Abril, Garça Editores, 2004.

vai Ela aos 33, com pétalas, hoje, sombrias...

Bento de Jesus Caraça, torturado no antro dos suplícios pidescos, perguntou ao carrasco: "Porque me torturam?" Ao que o algoz respondeu: "Se o não fazemos, amanhã está você no lugar onde eu estou, a torturar-me." Com a serenidade da sua elevação moral, o cientista respondeu: "Não. Eu nunca o faria, visto que estou aqui porque nunca podia estar no lugar onde você está."

(citado por Natália Correia, in Poesia Completa, Dom Quixote).

terça-feira, abril 24, 2007

criptofonias

indecifráveis palavras nos teus lábios persistem
incomuns mensagens
(as não partilhadas)

contigo falo.




baixam as vozes à recôndita partida lá onde se indecidem os sons, erguidos ao corpo os gestos. volteia etérea a perfeição. a agressão no rito pousa. aos póros afluem pávidos os sinais. a mão a esmo aos ventres chama. o seio à boca freme. a boca à boca grita. o afago livre da fonte voraz esvoa. túmidas as palavras vertes.

segunda-feira, abril 23, 2007

ufana bulha

lívido, o dia, diz-te ao ouvido, Bem-vinda que emerges pura, tão pura quais areias do deserto,
e há sangue a escorrer, sangue a escorrer, dos ditos, espuma de sargaços, algas que enforcam a pele, a pele
e falas e dizes-dizes dores de ora e de outrora, nojos futuros
e a lúcida loucura, a lúcida loucura, incha de ira a rocha bramadora de augúrio ao vento
além, além, a meio do vale verde há três carvalhos antigos de atalaia às memórias espojadas pelas ervas
feridas abertas, em tua boca gritos de orquídea, ufana bulha, ufana bulha.

a asa. sombria a pena

a asa do negro corvo
teu pálido rosto tapou
teu negro olhar sumiu
sob sombria pena
ecoaram grasnares na noute
ecoaram grasnares na noute

mutuar

fiz a libação com o vinho da ânfora ocre
e aos deuses ofertei o bolo ázimo
exigiram teu corpo imutilado

domingo, abril 22, 2007

provincianos domingos de um labrusco serrano

Saída de Viseu por volta das 10:00. Castro Daire, Alvarenga.
A Casa do Décio condoeu-se dos peregrinos e apaziguou-os com vitela arouquesa, cabrito serrano e costeleta de 600 grs a peça! (com arroz de carqueja, ao forno alourado, e batata assada, da leira ao lado).
Esta rapaziada é lesta a amesendar. Talvez crentes convictos do aforismo anunciador que à mesa não se envelhece, são lentíssimos a abandonar a arena da gladiação, três horas volvidas.
E só o fazem, prescientes dos despojos todos saqueados...
A descida de Alvarenga para Arouca (um serpentear de 20 quilómetros), de tão verdejante e frondosa alenta-nos o ímpeto e chama-nos à sombra da bendita ramaria.
Regresso à origem, sentimento de romaria cumprida, por arredor das 19:00.
O dia está ganho.
O corpo esmoído, alquebra-se.
Amanhã perfila-se a quase última semana de Abril, a meio partida, ufana, de feriado ao Povo.
Na foto, tirada pelo Lobão Teixeira, este Vosso criado, de corpinho dorido, por tanta canseira...

algures entre a arada e o montemuro


As paisagens são roubadas do céu das águias.
Os caminhos, estreitíssimos, em terra batida ou areão sobre alcatrão, ladeiam-se de precipícios de centenas de metros (muitíssimo impróprios para os carros que conduzimos, que se atravessam inesperadamente cada vez que se acelera um pouco mais...).
Os montes sucedem-se, regulares e nus. As zonas verdes rebentam da ardida terra. O xisto tem ali casa posta.
Em baixo, muito em baixo, corre o Paiva remansado (o rio menos poluído da Europa).
A toponímia dá-nos palavras como Parada de Ester, Ermida, Cabril, Trancoso de Alvarenga, Canelas, Arouca, Moldes, Janarde, Coveló de Paivó (em Vila Nova de Paiva existe um Covelo de Paiva), São Macário, Aldeia da Pena, Gafanhão, Reriz...
As aldeias, perdidas a esmo no meio da serra, têm homens crestados unidos em rebanho (ou alcateia) à porta da taberna, copo de tinto na mão. Vêem-nos passar com um ar indiferente como se estivessem à beira de uma via rápida, e somos, talvez, os únicos veículos da semana...
O cheiro, ácido, a mijo da de ovelha, toma-nos as narinas, de súbito e distrai-nos do odor a rosmaninho que nos assola.
É o Portugal profundo. Alheado de tudo que não sejam as leviandades do tempo, o preço dos adubos, da madeira de eucalipto e do anho à peça.

sábado, abril 21, 2007


cabras de trote difícil


Animais doentes as palavras
Também elas

Vespas formigas cabras
De trote difícil e miúdo
Gafanhotos alerta
Pombas vomitadas pelo azul (...)

A. O'Neill, Poesias Completas, 51-86, Lisboa, INCM

sexta-feira, abril 20, 2007

um grande amor


I. Estar apaixonada é a pior doença. A minha vocação é estar sempre doente. Irremediavelmente, seguidamente, profundamente, permanentemente doente.


II. É verdade, o amor que me falta. Concretamente é isso que me falta. Um grande amor para as margens do rio e para as ruas brancas da cidade. Um grande amor de dia e de noite. Um grande amor selvagem e macio, e ao mesmo tempo frio, leve e frio, como o ar que respiro de noite nas ruas da cidade.

Enfim, um grande amor que eu já não tenha usado.


Yvette Centeno, Três Histórias de Amor, Porto, Ed. Asa, 94.

irreflexões

Penso mas não existo logo.
Só existo passado um bocadinho.
Yvette Centeno, Irreflexões, Lisboa, Ática, 74.

e porém, é mentira...


'Splende o sol. Ri o verde. Além, o mar
É azul fundo do azul leve do ar.

(...)
F. Pessoa

quinta-feira, abril 19, 2007

lusas formosuras

Para as mais belas, elegantes, picantes e galantes moçoilas do universo, as Lusitanas, uma rosa recém-colhida, ao fragor da trovoada...

quarta-feira, abril 18, 2007







perverso --» virado para o caminho errado


a tua perversidade está no trilho que segues
segues...
segues...
no do caminho errado, na rota do desvio
do desvio?
a tua perversidade é o teu impulso
o teu impulso
descontínuo, impossível, obscuro
obscuro
scuro
quando deixares de ver a ilusão
a ilusão?
haverá escapatória?

letras à palavra presas

escritas
à palavra dadas
à palavra dadas
no papel retidas
fulguram
as letras
as letras
nas linhas idas
cicatrizes
de tinta
a risco
ousadas
ousadas