sábado, fevereiro 28, 2009

Atlântida


morfografia(s)


nãrandj


trois traces pour un regard perdu


sexta-feira, fevereiro 27, 2009

Argos, Ulisses & Penélope


rodovalho vaidoso


quinta-feira, fevereiro 26, 2009

'galgos'


'passarada'




terça-feira, fevereiro 24, 2009

assim, o crepúsculo na cidade...


dear pc


sáficas


atopias

(auto-retrato em véspera de carnaval)

Acontece estar onde não estou,
E sou, ao acaso do destino,
Desatino cumprido sem chegar.


E onde estou, é sempre lugar,
Espaço ou tempo onde sou
Aquele, mais ausente de ficar.

segunda-feira, fevereiro 23, 2009

PESSOA E O ESTADO NOVO


I.
(Salazar)
Já Maquiavel dizia que a máxima dos sábios dos nossos dias consiste em esperar o benefício do tempo, Oliveira Salazar, entrevista a António Ferro, 1932.
E foi, efectivamente, uma das arteiras praxis, entre outras, que este político engendrou.
Do 28 de Maio de 1926 ao advento do Estado Novo (1933-1934), decorreu o processo de transição da ditadura militar para o regime salazarista.
Salazar põe em prática o seu sinuoso caminho da tomada do poder, perante a hesitação das forças conservadoras e a profunda crise económica vigente, liderando o estabelecimento de um sistema de alianças entre a direita, tendo como base comum a rejeição do liberalismo e a criação de um Estado forte e interventor, suportado no catolicismo social, no corporativismo, no antiparlamentarismo e no anticomunismo. Cria-se o Estado de partido único, com a União Nacional.
(…)
O ditador morre em 1968, na ignorância de que já não é o Presidente do Conselho de ministros.
A prestidigitação (quase) final.
Chega a liberalização (tardia) de Marcelo Caetano, abrupta e definitivamente terminada em 1974, com a Revolução de Abril.

II.
(O Estado)

Uma das possíveis análises e definições de Estado, sintetizada, diz-nos que o Estado é uma comunidade humana; que os seus elementos essenciais são o povo, o território e o poder político; que os seus fins são a segurança, a justiça e o bem-estar.
O Estado Novo não é, em sentido lato, uma comunidade humana, o povo não está na sua essência, a justiça e o bem-estar existem apenas para as minorias dos lugar-tenentes do regime.
Logo, redutora e simplisticamente, o Estado Novo é um falhanço redundante, que iludiu, ludibriou e reprimiu os portugueses durante quatro longas décadas.

III.
(Cerne da questão)
Fernando Pessoa, a respeito deste assunto:

SIM, É O ESTADO NOVO

Sim, é o Estado Novo, e o povo
Ouviu, leu e assentiu.
Sim, isto é um Estado Novo
Pois é um Estado Novo
Pois é um estado de coisas
Que nunca antes se viu.

Em tudo paira a alegria
E, de tão íntima que é,
Como Deus na Teologia
Ela existe em toda a parte
E em parte alguma se vê.

Há estradas, e a grande Estrada
Que a tradição ao porvir
Liga, branca e orçamentada,
E vai de onde ninguém parte
Para onde ninguém quer ir.



Poema In Pessoa / Persona , Agostinho Domingues, Câmara Municipal de Amares, I Centenário do Nascimento do Poeta, 1988.

Pessoa e os (efémeros) sábios no poder


I. Introdução

O poema que transcrevo está datado de 3 de Outubro de 1935
(escrito exactamente 57 dias antes do falecimento de Fernando Pessoa).
Se no texto não será (de todo) difícil encontrar uma alusão irónica à máxima do Estado Novo: se soubesses o que custa mandar preferias obedecer toda a vida
… verdade é também que a sua intemporalidade, o situa em todos os tempos, (passados, presentes e do porvir)…
conquanto haja autocracias regentes
maiorias absolutas vigentes
sábios engenheiros tiranetes de desdenhosa arrogância
discursos impositivos de demagógico e cosmético cinismo
(ou de cândida ingenuidade, vítima das conjunturas & das estruturas ou das estruturas & das conjunturas)
distorções e manipulações mediáticas do real e do coiso e tal
talentosos(as) sabiás
cortes de bobos, para-bobos, infra-bobos & escassos supra-bobos
(em contínuos salamaleques de cerviz caída)
varas de surdos
(escorrendo pustulentas babas dos auriculares)
récuas de mudos
(unissonizados em cacofonias gemebundas)
autistas alheados e resistentes ao circundante…

II. Desenvolvimento

Pessoa em 4 quadras
(forma pelo poeta praticada para desenhar uma universalização de conceitos mais intelectualizados, perífrase de servir cultura ao vulgo)
quase a gosto popular
(há-os que formalizam e despacham a gosto populista)
assim escreve:

OUVI OS SÁBIOS

Ouvi os sábios todos discutir,
Podia a todos refutar a rir.
Mas preferi, bebendo na ampla sombra,
Indefinidamente só ouvir.

Manda quem manda porque manda, nem
Importa que mal mande ou mande bem.
Todos são grandes quando a hora é sua.
Por baixo cada um é o mesmo alguém.

Não invejo a pompa, e ao poder,
Visto que pode, sem razão nem ser,
Obedece, que a vida dura pouco
Nem há por isso muito que sofrer.


III. Conclusão

…protestamos-lhe o estoicismo e a sombra do ouvir
E porque a vida dura pouco, há-de chegar (chega sempre) a hora de agir.


.

Os “ismos”, ou a rotulação barata da genialidade


Fernando Pessoa nasce em 1888 e morre em 1935, tem o Estado Novo, iniciado em 1926 nove anos de vida.
Alturas houve, na nossa História recente, em que era de modelar tom taxar ou rotular os nossos génios de fascistas, comunistas e outros “istas” de parquíssimo fundamento.
Se Fernando Pessoa, politicamente, manifestou alguma simpatia, fê-lo pelo sistema monárquico, embora não deixe de considerar a “Monarquia completamente inviável em Portugal”.
Porém, fosse o que fosse, a sua obra tudo superou e imortalizando-o, levou a língua portuguesa mais longe que as caravelas quinhentistas e fá-la perdurar e estudar por cátedras de Estudos Pessoanos, mundo afora.
Aliás, a seu respeito (e dentre milhentos autores e escritos), escreve Bloom, inO Cânone Ocidental”, (ed. Temas e Debates, 1997):
Fernando Pessoa, que, enquanto invenção fantástica, ultrapassa qualquer criação de Borges (…) é Whitman renascido (…) originalidade tão descomedida (…).

Este meu arrazoado serve apenas para deixar hoje, prometendo voltar ao assunto em tempo oportuno, um poema do autor, nitidamente demarcado do regime salazarista e do ditador…
Seria até despiciendo mais considerar, se tivermos em conta que Mensagem, única obra que viu prelo em vida do poeta, um ano antes da sua morte (1934) foi secundarizada em concurso literário promovido pelo aparelho político/cultural da época.

Aqui fica:

ANTÓNIO DE OLIVEIRA SALAZAR

António de Oliveira Salazar.
Três nomes em sequência regular…
António é António.
Oliveira é uma árvore.
Salazar é só apelido.
Até aí está bem.
O que não faz sentido
É o sentido que tudo isto tem.

Este senhor Salazar
É feito de sal e azar.
Se um dia chove,
A água dissolve
O sal,
E sob o céu azul
Fico só azar, é natural.
Oh, cós diabos!
Parece que já choveu…

Coitadinho
Do tiraninho!
Não bebe vinho.
Nem sequer sozinho…


Bebe a verdade
E a liberdade.
E com tal agrado
Que já começam
A escassear no mercado.

Coitadinho
Do tiraninho!
O meu vizinho
Está na Guiné
E o meu padrinho
No Limoeiro
Aqui ao pé.
Mas ninguém sabe porquê.

Mas enfim é
Certo e certeiro
Que isto consola
E nos dá fé.
Que o coitadinho
Do tiraninho
Não bebe vinho,
Nem até,
Café.


Publicado In Diário Popular, 30 de Maio e 6 de Junho de 1974.
Publicado por Jorge de Sena.
(Citado por António Quadros, Poesia III, p.148).
Referido em Pessoa / Persona, por Agostinho Domingues, em ed. da Câmara Municipal de Amares, 1988, no I Centenário do Nascimento do poeta.

pink gate


domingo, fevereiro 22, 2009

ah, a esperança...


E um Topolino, que circula à terrífica velocidade de... quase 60 k/h...

O Sol...

Hoje, 'un petit tour' num belo Peugëot 504 Injection, Cabriolet.
Design Pininfarina, de 1973. Intemporal.
Do amigo Abranches.



G.

Ils n'ont pas à porter leur face
Comme un supplice.

Ils n'ont pas à porter de face
Où tout se lit.

Guillevic, E. - Terraqué, Gallimard, 1945.

sexta-feira, fevereiro 20, 2009

aquilino (recorte de imprensa)

(clique)
A Maria José Quintela, na sua sempre arguta e cuidosa atenção, descobriu esta notícia que teve a gentileza de enviar e aqui vos deixo, com uma ponta de orgulho...
Obrigado MJ.

quinta-feira, fevereiro 19, 2009

lá em baixo, o mar...



'deprimere', foi... pesar de alto a baixo (e humilhar)

Acinzento-me em tácita consonância com o tom do céu escuro e pesado como o chumbo a quem furtou a cor e eu o peso depressivo da melancolia.
Como houvera aliás de resistir se até o mar sem fundo e fim que é azul e verde e brilha hoje é cinza em movimento cadenciado de lava fria sem graça?
Estamos tristes, o tempo e a paisagem e eu… como é boa esta harmonia grandiosa! Porque estás feliz, não participando nela? Porque estás contente? Olha em redor de ti e melancoliza-te solidário e humilde e com respeito!
Não sabes ainda que o sol é vida e a noite morte? Que a chuva são as lágrimas de dor da natureza? Que os trovões a sua ira? E os raios a sua ígnea maldade? Que o sal do mar vem das lágrimas choradas e nele vertidas?
Esqueceste a subtil sabedoria da infância.
A lógica racional fez-te sisudo sabedor roubando às coisas a grácil inocência do mistério, fazendo do deus sol uma estrela, das palpitantes trevas noite, do fértil dom das nuvens chuva, da ira de Júpiter electricidade estática, e do sal já não lágrimas poéticas mas um fenómeno qualquer acre e sem graça.
Como sem graça e amarga é a nossa vida da qual já tudo sabemos sem ilusões nem mistérios…
Por isso me acinzento e em milagrosa inversão sinto a reverência humilde do céu e do mar, do tempo e da paisagem, tristes da minha tristeza, deprimidos pela minha depressão, e todos juntos, melancólicos
!

mais um "bonecro"


escrita(s) -(re-visitação)

a tua escrita, para mim, é mais geográfica do que singular, mas nesta geografia reside a sua singularidade, porque não usas palavras avulsas, porque tens de repente uma tela à tua frente e começas a desenhar uma pauta de música. primeiro as cordas horizontais. depois os traços. e ao início escreves matematicamente. respeitas os limites das linhas impostas. mas esta regra é rapidamente transposta. porque a agulha do teu disco salta. ainda assim um movimento rigoroso. como um tigre sobre a presa. mas dá-se logo um descomportamento. quando os movimentos deixam de ser estudados e prevenidos. e passam a ser vorazes e determinados. o tigre come a sua presa! as tuas palavras desenham um mapa. uma cartografia incessante. o destino é apenas o início

ANA

A Testemunha Impossível


(in "Matérias Sensíveis", Molder, Maria Filomena, Relógio D’Água, Dezembro de 1999)

“O facto de se representar não anula, no que respeita ao representado, a inerência de irrepresentabilidade (do mesmo modo que o facto de termos esquecido o inesquecível não altera a sua natureza de inesquecível, apenas põe à vista que não estamos já em condições de reconhecer aquilo que merecia ser lembrado por nós), mas arrasta consigo uma incapacidade em aceitar que haja irrepresentável, uma vez que o que está à nossa frente é visivelmente representável, fotografável naturalmente. Uma irresistível inferência obriga a dizer: se isto é visível é representável, se é representável não pode ser irrepresentável. O que é uma forma radical de cegueira ao rebatimento recíproco entre representável e irrepresentável, da mesma família da cegueira que, por obediência ao princípio da não-contradição, se recusa a admitir que um quarto vazio esteja ao mesmo tempo cheio de luz.
São múltiplos os esforços autojustificativos desta cegueira, no quadro de uma qualquer teoria social, antropológica, de uma doutrina moral ou de uma qualquer interpretação estética. O quadro mais poderoso é ainda o da doutrina moral do testemunho, que se tematiza no acto de testemunhar. Nos casos-limite, isto é, nos casos em que o irrepresentável se despenhou sobre o representado no próprio momento da representação, apropriado por uma operação de dar a ver, a saber, uma operação fotográfica, é aí que nome e o acto de testemunhar conhecem o cativeiro.
Desse cativeiro nasce o paradoxo da testemunha (da guerra, da dor insuportável, do campo de refugiados): o irrepresentável só pode ser testemunhado por aqueles que já não, nunca mais poderão testemunhar, que agora já não podem testemunhar, nunca mais. Deles dizemos que são testemunhos vivos, representados nas imagens como enviados certificadores de um estado de coisas, mas eles não se podem destacar de modo nenhum disso de que são os vivos, reais, testemunhos, pois foram atirados para um abismo, onde as categorias, os modos de dizer, se esvaziaram, e onde ser mãe, ser pai, ser filho, ser irmã, respirar, respirar, comer, desejar se tornaram intangíveis, isto é, não se pode em absoluto continuar a viver, embora se continue a viver.
Nesse ponto, definitivamente, a fotografia obscurece o visível por ser tão visível, só visível, e cega aquele que olha para ela. Tendo o visível sido representado (não sabemos mais aquilo que se mostra: quais as formas imaginativas? nem quem se exprime: o fotógrafo?), o irrepresentável coincide com o nosso olhar cego e é submergido, devorado e confundido com a retórica própria das condições de representação. A única resposta seria fechar os olhos, baixar os olhos, tapar os ouvidos, deixar escapar mil gritos, cair. Mas também enxugar o suor da fronte, deitar-se ao lado, abrir a porta.”


Nota:
A cegueira é isotópica em MFM?
Ela própria sendo muito míope e usando óculos muito graduados...
De viva voz lho ouvi durante uma sessão de "Ornamento e Estilo":
Deus tira a visão àqueles que quer perder

Fun-Xico

Xico-Sério
O Francisco, meu primeiro sobrinho-neto e a mãe-Ana.


A escrita da imagem

Se a imagem vale dez mil palavras, no dizer milenarmente sábio dos chineses, por quê escrever sobre a(s) imagem (ns)?
Para uns, a escrita é o substituto degradado da palavra, simbolizando a perda da presença: a escrita chega quando a palavra se retira e permanece como símbolo da palavra ausente.
Jean Lacroix escrevia sobre a escrita --»
um esforço secundário e perigoso para reapropriar-se simbolicamente da presença.
Os chineses conferiam à escrita um valor tão grande que a caligrafia superou, por exemplo, a pintura.
Para eles, a sua escrita figurativa, essencialmente simbólica, deve ressumbrar todos os elementos da linguagem, sonoros e gráficos, ritmos e sentenças, destacando a eficiência do símbolo, para expressar o pensamento, impondo o sentimento de que exprimir não é evocar, mas sim realizar.
Ademais se sabe que a língua chinesa falada tem variações de intensidade e entoação da mesma frase que pode alterá-la até significar realidades muito diferentes e mesmo completamente antitéticas.
O que é escrito é fixado definitivamente, daí, entre outros, o seu carácter conservador por oposição à dinâmica transformacional da linguagem falada.
Escrever sobre o corpus captado por uma objectiva, sobre a imagem pintada, que valoração ou mais-valia lhes concederá?
E se, em simultâneo, usássemos uma linguagem mais plural, em que a imagem e a escrita se enliçariam numa escultura de significação(ões)?

Estes pontos aqui esquissados ao sabor breve de uma inspiração fortuita poderão ser mais longe levados.
Vamos tentá-lo.
A escrita é redutora se for só denotativa e não se eivar de polissemias.
Se a escrita veicular representação (ões) de valor conotativo, perderá a linearidade sintagmática e ampliar-se-á nas ‘tergiversações’ paradigmáticas.
Hesitação/Decisão essência das transgressões.
No entendimento de fuga à norma.
A escrita, assim obliquada, como que a escorregar travessa da linha direita que a enfileira, é tão valiosa como a imagem, pois passível, como ela, de enfoques e/ou perspectivas várias.
De milhentos ângulos, mesmo.
Mileangular’.
Contudo, a imagem atrai de imediato (ou repele) na sua apresentação espectacular.
A imagem, enquanto representação policromática (mesmo o preto e branco tem gradações várias de tom, os cinzas, p.ex.), tem profundidade, tem planos, tem, à evidência, representações do real (ou do irreal) que a escrita (con)figura, mas de modo menos evidente, sim de forma mais críptica.
Toda a escrita é código, todo o código carece de descodificação para ser perceptibilizado.
Mas e a imagem, não é também código?
Claro que sim.
Claro que não.
É imediatamente observável.
É espectáculo puro, representação primeira (primária?).
A escrita não colhe nessas facilidades a adesão do spectator.
A prática epistolar, tão em desuso (re-novação) nos dias de hoje, conferia à palavra a presença do(s) ausente(s).
E de forma lenta.
Hodiernamente, a escrita re-envia-se à velocidade da palavra dita.
Posso usar qualquer meio do tipo messenger para escrever e ser emissor receptor como se de um acto de oralidade se tratasse.
Em termos cronológicos, claro.
E que concluir dessa alteridade?
Pelo menos, que também a conservadora escrita volveu veloz ao encontro atempado do frenesim da época…pelo menos…
Lacroix conferiu-lhe a perigosidade na apropriação da presença.
Como assim?
Perigoso é o que constitui uma ameaça, que põe em risco a integridade física de uma pessoa ou a existência de uma coisa.
Mas também, que envolve risco, que é susceptível de fracasso ou de insucesso.
Ou ainda, que não merece confiança e é capaz de causar dano ou prejudicar.
Logo, as palavras escritas, para o citado, pela sua fixação, ausência de emissor, testemunho inquestionado, variedade de interpretação, são um ameaçador perigo ou uma perigosa ameaça.
Talvez.
Os chineses, talvez também por isso, pela forma figurativa, pictográfica da sua palavra, culminavam-na de importância.
Mais lhe concedendo imagem expressiva e até emotiva.
E porém, decidiram que uma imagem vale mais do que dez mil palavras.
Ou será que as palavras são tão plurivocamente perigosas que uma imagem, na sua imediata representação, não proporciona tanto risco?
E daí o seu valor (benefício?).
Sabemos ainda, que apesar do valor que era por eles concedido à palavra escrita, esta só atingia a plenitude expressiva através da sua fonética, através da entoação/intensidade…
E parece-me que rolamos como seixos em leito lento de córrego, de oxímaro em paradoxo.
Será?
Pois que seja!
E que seja ainda um botar à terra de sementes para colheita pródiga, em termos de reflexão.
E retornemos ao incipit : A escrita da imagem.
Não será adir a uma imagem um texto (e porque não vice-versa?) reduzi-lo (a)?
Tirar ao spectator / leitor, a sua capacidade de enfrentar sozinho o caminho, e chegar?
Será a adição redutora?
Ou facultativa, para os mais desatentos, para os mais relutantes à descodificação, de uma mão cheia (a do semeador?) de pistas, de sinais (de alerta?), de vias para a riqueza do metatexto?
O horizonte atrás do horizonte?
Este texto (infra texto), é nem mais que uma reflexão, não em voz alta mas de vivo texto.
É uma sucessão de hipo teses.
Daqui se abra a discussão e acedamos a convertê-lo em tese de alguma coisa, nomeadamente, da relação íntima (e inseparável?) da escrita com a imagem, forma talvez hermes-afrodita que alguém, algures, por sensatez (?), sabedoria ou cruel perfídia, dividiu ou des con juntou…

Paulo Neto
Viseu
16 de Outubro de 2006

quarta-feira, fevereiro 18, 2009

luzeiro


textos idos


Nutro hoje especial e peculiar carinho e simpatia pela minha pessoa.
E estou-me nas “tintas” para a legitimidade de tal sentimento, neste nimbo de disciplina auto-suficiente que almejo, inclemente, impor-me.
A opinião de terceiros sobre o assunto é-me alheia e indiferente, o que me faz voar em mach 3.
É 4ª feira. Deitei-me às 18h15. São 20h30 e, ora, escrevo, para ficar no papel este sentir.

1 – Determinei no início desta semana não gastar 1 euro. Nem num jornal. Mesmo as voltas de carro têm sido limitadas para evitar ir abastecer.
Creio que até sábado terei sucesso. Aí, deliberadamente, saio com os copaîns para um passeio-clássico, com almoço incluído.
E tenho que comprar o expresso e o público, petite habitude prevaricante que não hesito em preservar.
Qual o objectivo(s)?
Resistir ao consumo exagerado do nada, vazio vil onde se espraia a gula da fácil tentação;
Ordenar as minhas contas-correntes, que não aparentam nem detêm a melhor saúde…

2 – Estacionei o carro às 16h50 no parkpress da psp, para dar um curto passeio a pé pelas ruas-casbah-do-centro-consumista.
Iniciei a deambulação a ver montras, deleitado, na certeza e comprazimento de que nada haveria capaz de me tentar e alterar esta regra nova.
Olhava a gant, no início da rua direita, quando me tocaram no ombro esquerdo.
Era uma pessoa amiga que já não via há mais de meio ano.
Olá-olá-vamos-tomar-um-irrecusável-chá… Entrámos num velho centro comercial bafiento e semi-deserto. Perguntou-me muito soft que moda nova era não atender o telemóvel. Respondi-lhe, muito light, que tinha outro número e que o antigo chegava a estar semanas inteiras kaput. Retorquiu que ficava a impressão digital da chamada não atendida. Expliquei, cândido e credível, que o aparelho só me deixava o nº em msg. Que não identificava os 10 ou 15 números que lá apareciam, cada vez que ligava o “coiso”. E que não tinha o desplante (forma chic do descaro) de telefonar para todos a saber quem eram-olá-tudo-bem-tenho-uma-chamada-não-atendida-desse-nº-com-data-de-há-5-dias…
Anuiu sem bulha. Perguntou-me se saíamos hoje. Respondi que tinha um compromisso, que me era de todo impossível. Sibilou, suave, que dantes não havia compromissos que nos inviabilizassem…
Fraco, abri-lhe o coração (ah! velho músculo!) e confessei que estava a gostar de alguém e que me era fisicamente não aceitável transgredir uma fidelidade que auto-erigira em bandeira de uma qualquer pseudo-dignidade há muito perdida.
Sorriu, compreensiva, parecendo aceitar como boa a complicada asserção. Acabámos o chá. Levantámo-nos. À despedida, distraída (decerto), deixou no ar: “Estou sozinha, em casa, à espera do teu telefonema para sairmos…” e partiu, coleante, nas sombras que da noite descaíam.
E eu parti, também. Para casa. Deitei-me às escuras. Chamaram-me para jantar. Em pijama, comi um caldo e uma malga de morangos. Deitei-me de novo. Escrevo este testemunho.
Não sei se to enviarei. A negativa não será por pudor, nem a positiva por afirmação. Superei esses estados. Se to mandar (e terei que o passar a computer) no fundo, será somente (?) para não te omitir nada (parece-te bem?), mais do que para saber quão-excepcional-pessoa-eu-sou-que-assim-me-alardeio-em-sofríveis-qualidades…
Creio que vim para a cama para erguer um reduto de protecção à minha eventual fraqueza. O que me retira a tal-excepcionalidade-faz-de-contas.
Ouvi Mozart, às escuras. Aqueci-me no calor da roupa. Pensei em coisas várias. Esquematizei mentalmente o próximo artigo de jornal. Revi em espírito alguns poemas de Ricardo Reis.
Passa das 21h00. Já ninguém espera por mim, nenhures.
(…)
Estou satisfeito comigo e com a disciplina e rigor que exercito com êxito e epicurista renúncia. Superar as tentações, eleva-me. Das mais comezinhas às de mor vulto. Aquilo que para uns é trivial exercício de normalidade, para mim, carece de esforço e de tenacidade.
Sou um fraco, mas supero-me. Ou pelo menos, tento. Estou aparentemente muito sereno. Faço sobre isto prognóstico reservado…mas redentor…

Recordo o que escrevi 3ª feira à noite:

(…) tenho a boca de silêncios cheia
de renúncias prenhe o corpo
(…)

e, humildemente, recordo o meu compère de hoje, o tal Reis, que há muito, sapiente, escreveu:

Senta-te ao sol. Abdica
E sê rei de ti próprio
(…)


Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente
(…)

Que os deuses me concedam que, despido
De afectos, tenha a fria liberdade
Dos píncaros sem nada.
Quem quer pouco tem tudo; quem quer nada
É livre;
(…)

E caldeio-me, enleado, e ao Reis, e concluímos, em coro:

Perene flui a interminável hora
Que nos confessa nulos
(…)


(19 Janº 2006)

a recusada


(re)tributo a Sebastião Alba

“a nossa morte é um assunto de outros”

Escrevias tu, Alba, pouco antes de morreres.
Mas estavas enganado, homem!
Mataram-te, deixaram-te numa berma escura da estrada, perto de Braga (que também te viu nascer) a 14 de Outubro de 2000, e contrariados, quando descobriram o teu corpo atropelado, atiraram-te para a morgue, onde jazeste dias esquecido, até tua irmã te resgatar para te dar, enfim, à terra.
Se ainda te tivessem ignorado num banco de jardim, junto a uma fonte…

A tua morte era pois um assunto de ninguém.
Lá tinhas um bolso cheio de papéis.
Os teus fragmentos.
Uma identificação.
Mas os abutres não sabem ler papéis desalinhados escritos a tinta vermelha.

… Qualquer dia não te safas e és lugar de peregrinação.
Mesmo palrando como o papagaio do Jorge de Sena, momentos antes de morrer:
Puta que vos pariu, a todos!”

Poeta.
Morto atropelado.
& aventureiro.
Reúnes as condições essenciais para inflamares os imaginários vis.
Os das homenagens póstumas.
Aqueles que cuspiam para o lado ao entrever-te, mudavam de passeio ao vislumbrar-te, e punham um lenço alvo renova a tapar os dois buracos do ranho.

terça-feira, fevereiro 17, 2009

as palavras que dizem amor

As palavras são voláteis e volúveis
Recobertas com a espessura que queremos tirar do sentido
E da circunstância
Porém, os actos… ah, os actos…
Na sua nobre ou vil solidez contêm uma argamassa que os erige a alturas inefáveis
Posso dizer amor de milhentas formas
E contudo, senti-lo de tão raras maneiras…
E quando quero transmiti-lo desconfio até das palavras
Palavras que qualquer caixeiro-viajante de rutilante retrosaria
Usa no dia-a-dia…
Ah as palavras que dizem amor!
Como são banais e ao alcance dos oficiais de bons ofícios, de todos os ofícios…
E como isso me entristece
A mim, que queria ter palavras só minhas para dizer o meu amor


E como é possível que a língua-nossa-de-cada-dia
Aquela que diz pão, sim e não, irmão e dor…
Não tenha a palavra para dizer o meu amor?
Uma palavra que fulgisse, que estrelasse o breu
Que fosse sedosa e imperiosa
Que se dissesse aos gritos e em sussurros
Que te acendesse as chamas dos olhos e do corpo
E te banisse as dúvidas da boca e coração
E fosse ainda capaz de te roubar a razão…

Ensaio gestos que as supram
Num bailar de mãos e pernas confundido
E grotesco resulta o arabesco intentado
E o gesto, o gesto que também me falta
Cede ao silêncio da renúncia
… A eloquência mais singela, imaculada e verdadeira
Que encontrei
Para te dizer o meu amor…
E quando não entendes e nele sabes ler tudo
Menos aquilo que diz…
Lês arrogâncias desmedidas
Orgulhos desmesurados
Acintes açulados
Crueldades cometidas…


… Lês tudo o que lá não está
Eu, mudo, entristeço-me ainda mais

E penso que se não soube achar palavras
Se os gestos foram inábeis piruetas
Se o silêncio apenas gerou equívocos calados
…Tão distantes de mim… do meu amor
De tudo que queria para ti. E tu recusaste …
Até a dor…
Sou um fraco amador que achou o amor
E nunca to pôde dizer
Pela fé perdida nas palavras
Pelos gestos não gerados
E pelo silêncio até tão mal ouvido…



Viseu, 25 de Janeiro de 2005
22h10

















terça-feira, fevereiro 10, 2009





O 'BREVITAS' ausenta-se por uns dias.




Até breve.


segunda-feira, fevereiro 09, 2009

como um côrrego...

diluía-se num açude de desejo escuro e regurgitante num roçagar contínuo das mesmas águas sobre os mesmos seixos mesmos limos mesmos leitos de abraços revoltas tumultos ocultos revoadas ácidas iras refluentes na fundição de todos rumorejos suaves delírios ânsias insanes lírios ondeantes de cor caule odor e dor estremecimento espasmo de inquietude sem açaimos vibrante enérgica exultante ao pedir trégua e paz fuga das seivas açude de desejo aceso suaves murmúrios das diluições perdição mistério água negra véu pudor de nosso amor boca e bulha de gritar-te alerta de conter-te fuga e fúria fogo e dor sofrido amor ido ensejo no açude de desejo

Rua do Arco

Num trecho da muralha afonsina, às espaldas da Porta dos Cavaleiros, queda-se em seu nicho, abrigadinho da chuva, este S. Francisco (não sou especialista em hagiografia) com uma pomba na cabeça e um anho aos pés. Mal entrada a porta, sobre a esquerda, o Solar dos Albuquerques, cenário de O Amor de Perdição, de Camilo C.B.

lá, cordas de chuva fria ...

... aqui, o calor da cor.

domingo, fevereiro 08, 2009

Aux armes, citoyens!

Se o próprio príncipe é virtuoso, o povo cumprirá os seus deveres sem que lhe ordene; se o próprio príncipe não é virtuoso, pouco importa que dê ordens; o povo não as seguirá.
Confúcio

E se fôssemos pombo(a)s?


Sociais, estes seríeis Vós.
Solitário, este seria eu.





Janelas de Viseu

Daqui alçou vista de El-Rei, Dom Duarte, diz-se...
Magnífico, o Manuelino.
Por Santa protegida...
E por pomba, também...
De pombal... pombalino.
Os tempos dos ares comprimidos.
E pomba em telhado de zinco?

O decadente século XX.
De lira de Orpheu, casa de poeta?



Esta palmeira parece-me um papagaio velho e caduco...
Lavrar na pedra.

E se nos dedicássemos a estudar as sincronias temporais através das suas janelas?
Também seria mais uma plausível abordagem da História?